Em média, dez pessoas passam diariamente por debaixo do viaduto da Avenida Francisco Sales, no bairro Floresta, na Região Leste de Belo Horizonte, para cortar o cabelo e fazer a barba. O “salão” de Júlio César Vieira da Silva tem uma cadeira instalada perto de um dos pilares. Em uma mesa improvisada, ele prepara a tesoura, a navalha e o aparador de cabelo.
“Quem pode, fortalece. Quem não pode, agradece. Entra feio e sai bonito”, disse o barbeiro, que recebe dinheiro apenas de quem tem condições de pagar.

Pessoas sem-teto, vendedores de bala e motoboys são os clientes mais comuns de Júlio, que começou o ofício dentro da cadeia. Ele cumpriu pena de dez anos por tráfico de drogas.

Júlio saiu da prisão há poucos meses e está morando em um albergue da prefeitura. Lá, ele começou a cortar o cabelo de outros moradores. A fama dele logo se espalhou e Júlio passou a trabalhar em frente à residência.
Mais tarde, ao procurar por ajuda no Programa de Inclusão Social de Egressos do Sistema Prisional (Presp), ele conseguiu uma bolsa para fazer um curso de três meses em uma barbearia.
“Ele mostrou muito talento. Teve que se adaptar às tesouras, máquinas e navalhas. Com os materiais adequados, ele se adaptou e o trabalho foi evoluindo muito rápido”, disse o barbeiro Keko Boladão, mestre de Júlio.

A formatura dele será nesta terça-feira (1º), em seu “salão”, debaixo do viaduto da Avenida Francisco Sales.
“Você não imagina como algumas pessoas saem daqui. Não é só um corte de cabelo, sabe? É uma transformação. Quando elas se veem no espelho. E, puxa, cara. Eu ajudei nisso. Na autoestima. Feliz demais”, disse Júlio.

Mais do que se tornar um barbeiro profissional e, quem sabe um dia, ter seu próprio salão, o sonho dele é conseguir se reconciliar com o passado.
“Queria voltar a conversar com meus filhos. Quem sabe, né?”, disse, esperançoso.