Gritos, confusão e menções a Enel: Alesp debate privatização da Sabesp

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São Paulo – A audiência pública na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) sobre a privatização da Sabesp, promessa de campanha do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), foi marcada nesta quinta-feira (16/11) por manifestações e gritos entre manifestantes e deputados a favor e contra a proposta de desestatização.

O clima de “briga de torcida”, como o embate entre o público presente foi chamado pelo presidente da Alesp, André do Prado, serviu de pano de fundo para discursos acalorados por parte dos deputados inscritos, interrupções em discursos e pedidos para revisão do tempo de fala durante as mais de cinco horas de duração da audiência.


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Alguns manifestantes foram retirados do plenário pela Polícia Militar (PM) após discussões entre os grupos pró privatização, posicionados à direita na Casa, e contrários à desestatização, localizados à esquerda no auditório.

A secretária do Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística, Natália Resende, fez uma apresentação ao início da audiência explicando que houve um aumento na quantidade de municípios que possuem contratos com empresas privadas e citou o receio do governo de perder os convênios com outras cidades caso a Sabesp não seja privatizada.

“A Sabesp hoje é lucrativa, sim, mas ela corre grande risco de deixar de ser se a gente não privatizar”, disse Natália ao fim da audiência.

No projeto de lei enviado à Alesp, o governo propõe vender entre 15% e 30% das ações da Sabesp para um acionista de referência, mas mantendo uma golden share (“ação de ouro”, na tradução livre), o que concede ao governo estadual o direito de vetar decisões tomadas pela empresa.

Natália foi a única representante do Executivo e ligada à empresa a discursar. Além dela, falaram 30 integrantes da sociedade civil, com argumentos contra e favor à privatização, e também cerca de 30 deputados estaduais.

A ausência do presidente da Sabesp, André Salcedo, foi duramente criticada por deputados do PT e do PSol, partidos de oposição ao governo Tarcísio na Casa.

Os argumentos a favor da privatização enfatizaram a redução da tarifa e a facilidade para conseguir aumentar investimentos na companhia. Já os argumentos contrários alegaram que a empresa atualmente já apresenta lucro e eficiência, e que a tarifa da conta de água irá aumentar e os serviços devem piorar de qualidade.

 

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Comparações entre Sabesp e Enel

Os parlamentares de oposição e representantes de movimentos contrários à privatização da Sabesp citaram como exemplo negativo da privatização os problemas recentes com a Enel, concessionária de energia elétrica no estado e alvo de uma CPI na Alesp, após mais de 2 milhões de pessoas na Grande São Paulo serem afetadas pela falta de luz com o temporal de 3/11.

“Não podemos permitir que a Sabesp vire uma nova Enel”, disse José Faggian, presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo (Sintaema).

Deputados governistas, por outro lado, disseram que a concessão da Enel é federal, enquanto a Sabesp seria privatizada no âmbito estadual, o que facilitaria a regulação da companhia de saneamento básico.

“A secretária Natália deixou muito claras as diferenças entre a privatização da Enel e da Sabesp”, disse o deputado Guto Zacarias (União), vice-líder do governo Tarcísio na Alesp.

Confusão em meio a discursos

Após o discurso de um membro da sociedade civil, uma mulher contrária à desestatização da Sabesp, uma confusão ocorreu no plenário por causa do seu tempo de fala. O tempo de três minutos para discursar havia terminado e, antes que ela descesse do púlpito, o deputado Lucas Bove (PL), que discursaria na sequência, sinalizou que subiria mesmo com ela no local.

A audiência foi paralisada por alguns minutos enquanto deputados governistas e de oposição se amontoaram em torno de Bove e da manifestante, discutindo sobre quem teria o direito à fala.

Fotografia colorida mostra o deputado Lucas Bove (PL) discutindo com as deputadas do PSol, Mônica Seixas e Paula Nunes no plenário da Alesp durante audiência pública sobre Sabesp - Metrópoles
O deputado Lucas Bove (PL) discute com as deputadas do PSol, Mônica Seixas e Paula Nunes no plenário da Alesp durante audiência pública sobre Sabesp

Mais de uma vez, o presidente André do Prado pediu que o público presente fizesse silêncio e se manifestasse do lado de fora da Alesp para não prejudicar a audiência, sob a ameaça de suspender o debate caso o tumulto seguisse.

Em seu discurso, o deputado Guto Zacarias (União), líder da frente parlamentar favorável à privatização da Sabesp, afirmou que a companhia realiza “um trabalho porco”, enquanto o deputado Lucas Bove (PL) disse que, com a privatização, o governo acabaria “com o cabide de governo da esquerda”.

O deputado petista Emídio de Souza, líder da frente parlamentar contrária à privatização, disse que o governo Tarcísio “quer fazer um acordo com o mercado para vender a joia da coroa”.

Um raio-x da Sabesp, a “joia da coroa” que Tarcísio quer privatizar

A vereadora da capital paulista Luana Alves (PSol), inscrita para falar enquanto membro da sociedade civil, disse que a privatização da Sabesp não passará pela Câmara Municipal.

Os contratos da estatal com as prefeituras preveem o fim do acordo em caso de privatização, o que implica a necessidade de novos contratos. Por isso, as câmaras municipais também devem aprovar o projeto.

Ex-presidente da Sabesp defende privatização

Gesner Oliveira, que foi presidente da Sabesp entre 2007 e 2011 e defende a privatização, afirmou que a estatal “precisa de um sócio privado” para conseguir antecipar a universalização, como alegado pelo governo, e ampliar os investimentos.

“Reconheço as limitações da empresa, os enormes desafios e o momento diferente em que vai competir com plataformas privadas”, disse ele. “Precisamos de novos investimentos”, acrescentou.

Os caminhos até a votação

O projeto de lei enviado pelo governo Tarcísio à Alesp é debatido no congresso de comissões da Alesp, que reúne as comissões de Constituição e Justiça, Finanças e Infraestrutura. Após a leitura dos relatórios, encerrada esta semana, as próximas sessões serão abertas para que os deputados discutam o texto.

Caso o texto final seja aprovado pelo congresso, ele será encaminhado ao plenário da Alesp e enfim votado por toda a Casa Legislativa. Para ser aprovado, o projeto de lei precisa de uma maioria simples de 48 votos dos 94 deputados.